Legislação do Airbnb e meios de hospedagem alternativos
Que atire a primeira pedra quem aqui nunca se hospedou em um Airbnb – ou em alternativas de hospedagens similares. E como aqui no Turis, a gente sempre fala de profissional pra profissional, eu começo: a minha skin Turista ama hospedagens alternativas, mas a minha skin Gestora Pública tem dor de cabeça só de pensar.
Como em várias situações dentro do mercado, essa não seria diferente, sempre tem os dois lados, né? E a gente precisa sim considerar os dois lados, ainda mais quando falamos de Gestão Pública, que tem como papel o gerenciamento da sociedade como um todo.
Fica aqui, que vou compartilhar com vocês um breve relato, de uma experiência que tive enquanto exerci a função de Gestora Pública de Turismo em um município pequeno (cerca de 7 mil habitantes), no interior do Rio Grande do Sul. Assim que cheguei na Cidade, ao fazer o mapeamento dos produtos e serviços turísticos, me deparei com uma quantidade grande de opções de hospedagens alternativas – o que pra mim, naquele momento, era extremamente positivo, pois eu praticamente não tinha hospedagens tradicionais na cidade e haviam poucas quando a análise era feita sobre a região. E sabemos que para planejar turismo, opções de hospedagens são fundamentais.
Para a minha surpresa, alguns meses depois fomos notificados pelo Ministério Público, pois havia acontecido um sinistro em uma hospedagem alternativa, e o órgão estava questionando o papel da Prefeitura em não exigir uma regulamentação básica. E aí, a skin Turista acordou pra skin Gestora Pública. É claro que precisamos pensar em segurança em qualquer produto ou empreendimento turístico, afinal, existe ali uma relação comercial, e a partir do momento que essa relação se estabelece, existem direitos e deveres de cada uma das partes. Falando de hospedagem, precisamos também falar em legislação ambiental, formalização da empresa junto ao poder público (CNPJ, alvará…), PPCI, CADASTUR, ficha de hospedagem, termo de responsabilidade, quando houver necessidade de uso de imagem, acessibilidade, e sim, de tributação – pois é a partir desses tributos que o Poder Público vai investir e reinvestir no turismo.
Não tem mágica, colegas. É matemática pura, para investir, precisa arrecadar. E nós, enquanto profissionais precisamos cada vez mais disseminar que o turismo precisa ser visto de forma profissional. A valorização parte da profissionalização. Não é raro eu ver casos de empreendedores que investem no turismo, por achar que “tudo é festa”. Será que em outras áreas os empreendedores pensam dessa mesma forma? Fica aqui a reflexão.
Com uma frequência maior do que eu gostaria, eu escuto de empreendedores e gestores de turismo a frase: “Mas não vai acontecer isso na minha propriedade”. E eu espero, realmente, que não aconteça nenhum sinistro. Mas e se acontecer? Você precisa estar preparado para isso. Te digo, por experiência própria, que “prevenir é melhor que remediar”. Vai por mim, porque aqui já é mais de uma década de experiência e vivências junto ao trade.
LEGISLAÇÃO DO AIRBNB AO REDOR DO MUNDO
Voltando a falar mais tecnicamente da regularização das opções de hospedagens alternativas, vemos que no exterior cidades globais como Nova York, São Francisco, Berlim, Barcelona, Paris e Amsterdã lideraram o processo de implementação de marcos regulatórios para o aluguel por temporada.
Nestas metrópoles, a obrigatoriedade de registro dos imóveis junto às autoridades municipais e a imposição de limites anuais de diárias locáveis surgiram como medidas para assegurar uma fiscalização efetiva e mitigar impactos negativos associados a esta modalidade de hospedagem. Tais regulamentações visam não somente proteger o mercado hoteleiro tradicional de concorrências desleais, mas também prevenir problemas relacionados à segurança e ao bem-estar nas comunidades locais.
Você pode ler mais sobre o Airbnb em outros países aqui:
Panorama legislação Airbnb em vários países
Economia compartilhada: Airbnb, cidades e busca pela regulamentação
LEGISLAÇÃO DO AIRBNB NO BRASIL
No Brasil, a regulamentação das hospedagens alternativas encontra-se em uma fase incipiente, concentrando-se em iniciativas isoladas de municípios como Ubatuba (SP) e Caldas Novas (GO), por meio da Lei 4.050/2017 e da Lei Complementar 99/2017, respectivamente. Estas leis pioneiras estabelecem parâmetros para a locação de imóveis por temporada, incluindo a necessidade de registro e a observância da legislação tributária local, além de estipular limites temporais para as hospedagens.
Especificamente, a Lei Complementar 99/2017, em Caldas Novas, introduz a obrigatoriedade do recolhimento de taxas e impostos municipais por parte dos proprietários que disponibilizam seus imóveis para locação temporária. Além disso, esta legislação vincula a locação de curta duração à Lei do Inquilinato (Lei Federal 8.245/91), aplicando-se, portanto, aos aluguéis de até 90 dias. Este aspecto legal incorpora a atividade dentro de um marco regulatório conhecido, conferindo-lhe um contorno jurídico mais claro e previsível.
Já em Ubatuba, a Lei 4.050/2017 limita a duração das hospedagens temporárias a 45 diárias consecutivas, impondo, adicionalmente, a necessidade de obtenção de um certificado do CADASTUR e uma licença de funcionamento municipal. Esta abordagem evidencia uma tentativa de organizar a atividade turística, preservando o equilíbrio residencial e garantindo a arrecadação de tributos pertinentes.
Importante destacar que ambas as legislações municipais enfatizam a necessidade de autorização para locação por temporada em convenções condominiais, resguardando assim os direitos e deveres dos condôminos. Esta medida visa prevenir conflitos e garantir a harmonia no uso compartilhado de espaços residenciais, abordando preocupações frequentes relacionadas ao barulho, à segurança e ao uso indevido das propriedades.
TURISTA VERSUS GESTORA PÚBLICA
A importância de uma legislação local sobre o aluguel por temporada reside na capacidade de adaptação às especificidades de cada contexto urbano e comunitário. É claro que cada cidade possui desafios e necessidades únicas, o que evidencia que a elaboração de legislação não deve seguir padrão, mas sim ser customizada, de acordo com cada realidade para que assim reflitam as prioridades locais, ao mesmo tempo em que se alinham a diretrizes nacionais e internacionais.
Dito isso colegas, e pra finalizar, te convido a fazer essa reflexão entre skin Turista e skin Gestor Público sempre que estiver diante de um assunto que, como esse, precisa ser analisado de forma ampla. Nunca existirá apenas um caminho ou uma “receita de bolo”, o segredo é adaptar a sua realidade diante da legislação e sempre, sempre olhar os dois lados da moeda.
Fontes:
[CÂMARA DE VEREADORES DE CALDAS NOVAS – GOIÁS. LEI MUNICIPAL Nº 4.050/2017] [DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO DE ESTÂNCIA BALNEÁRIA DE UBATUBA – SÃO PAULO. LEI MUNICIPAL Nº 4.050/2017]