Carreira na Gestão por dados no Turismo, com Rayane Ruas
Imagine descobrir todos os segredos por trás da Gestão de Dados no mundo do turismo? Eu, Juliana Gutierres, colunista e parte da equipe Turismologia, conversei com uma especialista no assunto para trazer insights atualizados direto para você! Nossa missão é clara: compartilhar como os dados estão revolucionando a experiência dos viajantes, simplificando operações e impulsionando inovações na indústria do turismo. A entrevista traz exemplos práticos, explora tendências, destaca benefícios e desafios, inspira profissionais do turismo e promove o conhecimento sobre Gestão por Dados no turismo.
A entrevista foi realizada no dia 21/08/2023 com a Rayane Ruas, Turismóloga, Doutoranda em Turismo, Especialista em Gestão por Dados no Turismo, brasileira e que atualmente vive em Portugal. Vale ressaltar que a entrevista foi por vídeo, então a transcrição foi feita da melhor forma para uma leitura mais fluída, sem alterar o conteúdo e o objetivo da mensagem.
Devido ao conteúdo valioso, rico e extenso, resolvemos dividir a entrevista em 2 partes. A parte I apresenta a trajetória profissional de Rayane Ruas, conceitos sobre Gestão de dados e Big data, além de como a entrevistada empreende através da Sprint Dados. Ao final do texto, te contamos sobre a parte II!
*Observação do editor: A revisão levou em conta que a entrevista foi feita via vídeo chamada e a transcrição inclui expressões, interjeições e exclamações utilizadas principal e às vezes, exclusivamente, na linguagem falada. Para esta entrevista optou-se por retirar idiosincrasias, mas ao mesmo tempo não editar demasiadamente as falas da entrevistada para resguardar o contexto em que foram ditas. Portanto, optou-se por manter “erros” ao longo do texto, que configuram naturalidade à linguagem falada, desde que não comprometam o entendimento do conteúdo, a fim de editar o mínimo possível o texto e não violar o objetivo da mensagem.
Conteúdo do artigo
Escolha de carreira: Turismo.
Juliana: Rayane, você escolheu o turismo ou o turismo te escolheu? Como é que foi sua conexão com essa área?
Rayane: Ele me escolheu, não fui eu que escolhi. O meu sonho era ser jornalista, tipo life style. Mas com 15 anos fui à Espanha terminar o meu curso de espanhol e fiquei encantada com o país e voltei querendo morar lá de qualquer jeito. Terminei o ensino médio e fui fazer vários processos de seleção para ir para as universidades espanholas. Curiosamente, as minhas provas eram sempre anuladas, elas eram perdidas e depois de 3 tentativas de estudar, ou seja, 3 semestres, não consegui entrar – e conversava com o embaixador da Espanha que na época já era quase amigo. Ele já sabendo da minha trajetória, me sugeriu iniciar um curso e me transferir para a Espanha; eu já estava inscrita em Letras na UnB. Pensando nisso, ele disse: “não pode ser, tem que ser um curso de ciências humanas. Já que você quer jornalismo, tem que ser do mesmo departamento”, e aí eu entrei no IESB e olhei, qual é o curso de ciências humanas mais barato, que tem vaga que eu consiga fazer só pra me inscrever e transferir? E esse curso era Turismo. E acredite, não abriu turma para o primeiro semestre. A orientadora disse: “você vai ter que fazer primeiro o segundo semestre e depois você faz o primeiro, vai ficar devendo matéria.” Disse que não teria problema, só precisava me inscrever, porque meu objetivo era outro. Meu objetivo era ir embora
Mas em menos de um semestre, eu acho que em 2 ou 3 meses, eu fiquei encantada, apaixonada. Abandonei todos os meus planos de ir para a Espanha, abandonei todos os meus planos de ser jornalista. Fiquei realmente encantada com o Turismo e nunca mais saí da área.
Fiz a licenciatura, depois fiz uma pós graduação na Argentina, de Gestão de Patrimônio, Cultura e Turismo Sustentável. Logo em seguida, fiz o meu Mestrado na UnB em Turismo. No meio do caminho eu fiz, após o Mestrado, mais duas especializações, uma de Gestão de Projetos e um MBA em Marketing Digital. E aí agora vim fazer o Doutorado aqui em Portugal, também em Turismo.
Várias vezes na minha trajetória eu pensei, “vou fazer outra coisa, não sei, turismo, turismo, turismo, turismo, turismo, que que eu vou fazer com tanto turismo na vida? Não dá para fazer concurso, não quero mais”. Depois de um tempo no serviço público, a gente percebe que concurso não é para todo mundo. Cheguei a pensar agora no Doutorado, em migrar para relações internacionais, relações públicas, alguma coisa com o jornalismo porque eu sempre gostei muito. Mas não, minha paixão é realmente o turismo e resolvi no doutorado, fazer aquilo que estava me inquietando naquele momento que era a gestão por dados, então muito da sprint vem dessa gestão por dados que estava estudando lá no Doutorado.
Trajetória profissional
Juliana: De forma breve, fala um pouquinho sobre a sua trajetória profissional.
Rayane: Era aluna lá em Brasília, no IESB, quando estava no quarto semestre de 6 no total, já podia fazer estágio e comecei a procurar. Fiz estágio em Operadora, na Costa, em algumas agências, coisas muito breves, muito rápidas, mas eu sempre quis ir para o Convention trabalhar mais com Gestão, Planejamento e aí realmente consegui o estágio que queria. Na época, estavam implementando em Brasília os 65 destinos indutores e fui envolvida, inserida nesse grupo, num estágio do Convention para ajudá-los a preparar as reuniões e dei início a este trabalho com eles. Toda a minha carreira profissional foi na gestão do turismo. Conheci grandes amigos, colegas, mas que foram chefes também dentro desse grupo gestor das entidades.
A minha experiência mais marcante foi quando fiquei na Secretaria de turismo em Brasília por 7 anos, 3 anos numa gestão, 4 anos na outra gestão, ajudei a implementar o Observatório de turismo na primeira experiência juntamente com Ariadne Bittencourt, que hoje colabora conosco na Sprint Dados.
Teve uma troca de governo, como é normal, aquele fim de ciclo. E eu fui convidada, então, para ser a diretora do Observatório na segunda gestão, eu fiquei 4 anos na diretoria do Observatório, onde o “bichinho” dos dados me picou, o bichinho da gestão dentro do governo. A gente tem muito planejamento, tem muito indicador, tem muitas metas a serem monitoradas, o que para a sociedade isso não é claro, porque a gente, como sociedade não vê, mas quem trabalha na gestão pública e trabalha na área de planejamento, que é a área em que eu trabalhava, é extraordinária.
Então, dentro do Observatório, fui percebendo o quanto a gente tinha de dados e quanto eles eram importantes, fomos fortalecendo esse Observatório e chegamos a fazer parcerias com 10 ou 12 órgãos públicos para fornecerem dados para o Observatório do Turismo de Brasília.
Eu sempre me perguntava: mas será mesmo que eu preciso perguntar isso para o turista? Não é possível que com a internet, com tudo o que tem disponível, a gente precise realmente perguntar para o turista, quanto tempo você vai ficar aqui? Não é possível que em algum lugar essa informação não esteja disponível. Eu não preciso perguntar para o turista, com quem você veio? Ele comprou passagem aérea, ele vai ficar no hotel, em algum lugar estão essas respostas. Foi aí então, que veio a ideia do doutorado, de compreender como big data, os dados podem facilitar essa gestão do turismo. E aí foi quando eu vim para Portugal fazer o Doutorado na Universidade de Aveiro, justamente investigando a influência da tecnologia para os dados e não na experiência. Muita gente me fala, mas e a experiência? Os aplicativos? Não, gente, meu foco é entender como a tecnologia que gera dados pode influenciar e nos ajudar nessa gestão do turismo.
Gestão por dados e big data: o que são?
Juliana: O que é a gestão de dados? O que é big data? Muita gente confunde e acha que é a mesma coisa, mas explica um pouco como é que isso funciona.
Rayane: Vou começar pela gestão por dados. A gestão com dados, onde é um processo de tomada de decisão que a gente primeiro olha os dados e os números, para depois tomar uma decisão. Na teoria, é uma coisa muito simples, lógica e evidente, mas hoje no turismo não é assim. Nossos gestores decidem o que eles vão fazer, onde eles vão investir recursos com base nas preferências, nos acordos políticos ou com base naquilo que eles estão vendo, aquela entidade ou aquela associação que reclama mais, chateia mais. Eles pensam: “então é aqui que eu preciso investir”. Mas efetivamente onde precisa? Qual seria mais estratégico. Qual traria mais retorno? Qual seria a melhor solução?
Eu falo dos gestores públicos porque é a minha área de maior atuação, mas isso funciona também para os privados, para os empresários.
O que que eu vou fazer neste ano? Qual é o planejamento da minha empresa? Deveria pensar primeiro: Minha empresa tem um planejamento? E depois, qual é o planejamento da empresa? É melhor investir, ampliar os meus quartos ou é melhor investir em marketing? Onde eu vou investir em marketing? Onde eu vou anunciar o que eu vou anunciar? Como eu vou anunciar? Está todo mundo fazendo aqui uma campanha patrocinada no Facebook, vou fazer também. Mas será que é no Facebook onde está seu público? Será que é no Facebook onde você vai ter o melhor retorno? Às vezes sim, às vezes não.
Uma gestão baseada em dados pressupõe que, antes de se tomar qualquer decisão, a gente primeiro analise, olha um pouquinho, pára, olha novamente e depois a gente toma uma decisão.
Pelos meus estudos, e é esse o meu objetivo do doutorado, é medir o quão mais eficiente uma gestão pode ser quando ela tem mais dados, o que é bastante desafiador. Porque a gente sempre gosta de dizer: 1 real investido em marketing turístico, ele pode se converter em não sei quantos, né? 10, 20 reais para a economia. Mas se esse 1 real for bem investido? E se esse 1 real for mal investido? Qual é que pode ser essa relação? Então essa são algumas das minhas inquietações e que eu tenho como propósito ajudar os destinos.
Isso é trabalhar com gestão por dados.
E a big data...?
Rayane: E onde entra o big data nisso tudo? O que é o big data? Eu escrevi um livro que foi publicado ano passado (2022) e ele está disponível, gratuitamente, para quem quiser ler e conhecer um pouco mais sobre o assunto. Ele foi editado pela UnB justamente para que esse conhecimento fosse público, aberto e livre, não tem comercialização. No livro trazemos muitos exemplos práticos para os empresários, gestores, empreendedores: como é que eles podem utilizar e se beneficiar. Mas tem uma página do livro que eu gosto muito e que são as perguntas que eu mais recebo.
“O big data é uma tecnologia?” Não, ele só é possível com tecnologia, mas ele não é uma tecnologia. “Então o big data é um sistema?” Também não. Todo mundo gostaria porque o sistema está organizado, bonitinho, catalogado e o big data não está assim. Ele é uma confusão de coisas no mundo. “Então, o big data é uma fonte de dados?” Sim, ele até pode ser entendido como uma fonte de dados, mas é uma fonte que precisa ser trabalhada, que precisa ser estruturada para ele virar efetivamente uma base de dados. Então, o big data é uma nova forma de se entender a atividade turística a partir de volumes grandes, afinal de contas, a gente tá falando de big, volumes grandes de dados que estão dispersos em muitos, muitos, muitos lugares, mais fácil do que entender big data é entender o que que a gente precisa fazer para utilizar. Nós precisamos estruturá-lo, normalmente ele nunca está organizado, nós precisamos de alguma maneira, parametrizar.
Disse em uma reunião por esses dias que as pessoas normalmente acham que elas vão pro big data procurando uma resposta para uma pergunta específica, por exemplo, quero saber quantos dias o turista fica e qual atrativo que ele visita. Calma, big data tem personalidade, ele não vai te dar uma resposta assim, bonita, clara e exata do que você está perguntando, mas ele pode te dar muitas respostas, muito complexas de coisas que você nunca tinha pensado, então são algumas diferenças.
Se você me diz, temos que usar big data em tudo? Acredito que ele pode ajudar em tudo, mas nem sempre é a melhor forma, a melhor ferramenta. E aí vem uma das nossas grandes expertises, de conseguir fazer uma curadoria e entender onde cabe big data, a gente vai apostar qual big data nós vamos usar e como ele deve ser complementado para a gente conseguir compreender aquela realidade.
Empreendendo na Sprint Dados
Juliana: Você já explicou até aqui, como começou a se interessar por essa área e o que que te motivou a se especializar nesse campo do turismo. Fala então agora, como tem sido empreender nesta área através da Sprint Dados.
Rayane: É como sempre, desafiador, empreender nunca é fácil. Mas empreender numa área nova, em que ainda não tem grande valor, em que as pessoas no turismo ainda não a compreendem, é ainda maior. Eu falo que na Sprint eu tenho 3 grandes desafios. Eu tenho 3 pilares de atuação e o primeiro é esse que você já comentou. É sensibilizar, educar e ensinar para as pessoas que existe uma forma diferente da habitual de se tomar decisões. Então nosso primeiro pilar de comunicação, de esforço nas redes sociais é responder às seguintes perguntas: Você conhece a gestão por dados? Você sabe os benefícios que ela pode trazer para você, para sua empresa, para o seu destino?
Depois que você já ensinamos o que é a gestão eu tenho que ultrapassar um grande mito: É muito caro, não é para mim! Eu não tenho capacidade para isso.
Você já entendeu que é importante e agora até deseja isso para você, mas você tem esse mito, não é para mim, não é importante ou é não é pra mim? Eu não tenho dinheiro para isso, custa muito. É impossível, é surreal. Eu não tenho dinheiro para pagar!
Então o segundo desafio é fazer não só a pessoa entender que trabalhar com dados é interessante, mas que ela pode, ela consegue, é viável, é eficiente, vale a pena!
Só então depois disso é que eu consigo, vamos dizer assim, um novo cliente, depois que você vence essas etapas, então empreender nessa área não é fácil. Mas se fosse fácil, meu pai já dizia, todo mundo fazia! Então é apaixonante e desafiador. Mas para mim é uma realização muito grande, porque cada projeto, cada coisa que a gente faz, a gente entrega e agrega um valor que a gente sempre tem um resultado positivo, feedback positivo. Então só aí já vale a pena, faz sentido e a gente já sente essa realização.
Nós temos trabalhado com municípios, com regiões, que são as Instâncias de governanças regionais, com estados. Então a gente percebe que há interesse, pelo menos neste momento no Brasil. A primeira etapa de curiosidade, de interesses, de valorização, ela já está cada vez mais fácil de ser alcançada. Eu não vou dizer que todos, pois nós temos 2600 municípios turísticos brasileiros, mas a maioria dos gestores e principalmente dos maiores municípios, já entendem que trabalhar com dados é importante. “Não sei como se faz isso. Não sei como isso acontece, mas eu acho que eu tenho que fazer isso. Todo mundo está fazendo. Eu preciso fazer.” Então isso já é um passo no Brasil, isso já é um passo, mas ainda esbarramos nesse desafio, nesse mito inalcançável de um oásis que não é pra mim, um oásis que é do outro, muito legal, mas eu não chego nele, não vou ter algo assim. Que legal que eles conseguiram, mas eu não tenho.
Baixe aqui o livro publicado pela Rayane e aprofunde seus conhecimentos: Livro Big data no Turismo – Rayane Ruas
Na parte II desta entrevista, você poderá acompanhar qual o maior Projeto desenvolvido pela Sprint Dados, como funciona este mercado de atuação, tendência e visão de futuro, bem como o que você Turismólogo precisa fazer para ter resultados nesta área.